Após dois dias de debates, socialistas reunidos na Conferência Nacional da Autorreforma do PSB, no Rio de Janeiro, concluíram nesta sexta-feira (29) a primeira etapa do processo inédito de autocrítica do partido. Mais de 300 filiados discutiram o documento-base que traz um diagnóstico da crise do sistema político e propostas inovadoras para o país.
O texto foi analisado por cinco grupos temáticos, que ao final apresentaram suas propostas. Uma comissão irá adaptá-las ao documento que será colocado em consulta pública durante o ano que vem. Caravanas serão realizadas em todos os Estados.
Na plenária da tarde desta sexta-feira, coordenada pelo presidente nacional do partido, Carlos Siqueira, o líder do PSB na Câmara dos Deputados, Tadeu Alencar, afirmou que o partido representa um legado de decência na vida pública, de espírito público e visão republicana.
Diante de um governo que flerta com o autoritarismo e que promove ataques à democracia e ao patrimônio estratégico do país, a autorreforma se faz ainda mais importante para que os socialistas reflitam sobre o papel que cumpriram nesses mais de 70 anos de vida política e que ainda têm de cumprir.
“Desde seu início, em 1947, com a junção de setores médios da sociedade e de operários, da intelectualidade brasileira, o PSB teve sempre muito próximo das preocupações de melhorar as condições de vida do povo, que continua difícil”, afirmou.
“Eu acho da maior importância que a gente entenda que o Partido Socialista, de um lado, não pode deixar de cumprir seu papel de resistência, mas também não pode deixar de pensar num projeto para o Brasil”, afirmou.
Para Alencar, o PSB nunca se afastou dos compromissos com os mais pobres e, portanto, precisa enfrentar “essa afeição deformada com todos esses absurdos” que um governo conservador e de ultradireita impõe ao país com sua agenda de retrocessos sociais.
Quando a política é criminalizada, e os partidos são vistos como “mobiliários do século passado”, o PSB se dispõe a fazer uma autorreflexão, não sob pressão, mas com a consciência da necessidade de tomar atitudes para guiar o futuro como um partido de centro-esquerda, declarou o socialista.
“O PSB se dispõe, não tragado pela força, como a força das ruas de 2013, quando o Congresso Nacional praticamente aprovou e deliberou medidas sob a pressão popular. Aqui não estamos fazendo isso sob pressão”, disse o líder do PSB.
“É muito importante que nós possamos reafirmar os nossos valores históricos, os nossos compromissos com o povo brasileiro. Mas também voltar a ser aquilo que os partidos políticos não podem deixar de ser, sob pena de caminhar para o esquecimento, para o rodapé da história”, declarou.
Tadeu Alencar afirmou que o esforço de toda a militância na Conferência Nacional da Autorreforma reflete o sentimento e a clareza do partido de ocupar um vazio que existe na política. “Esse vazio decorre dessa incompreensão que não vamos sair dos problemas monumentais que enfrentamos pelos extremos”, disse.
“Sei que esse é um esforço de todo o nosso partido, e decorreu da sua visão clarividente de enxergar a necessidade dessa atualização, para reafirmar os nossos valores e compromissos com a justiça, com a democracia, com a liberdade, e com a justiça social”, afirmou.
A autorreforma é a preparação do PSB para se colocar “muitos tijolos”, a fim de estruturar uma saída para a política e para os gargalos estruturais que, muitas vezes, a esquerda brasileira não teve capacidade de responder positivamente e proativamente aos desafios do país, analisou Alencar.
Alencar destacou ainda o orgulho que sente em liderar a bancada socialista na Câmara, para quem vem cumprindo m papel de enfrentamento contra “todos esses ataques”. “São muitas trincheiras, mas estamos procurando retribuir a confiança do povo com trabalho, seriedade e capacidade de debate”, declarou.
Vácuo político
O ex-governador da Paraíba Ricardo Coutinho disse que o PSB tem um espaço grande a ocupar no atual cenário político, marcado pelo conservadorismo e pela polarização. “O vácuo político existente pode e deve ser ocupado pelo PSB. Somos um partido com história e que precisa se reinventar. Ninguém está fazendo o que o PSB vem realizando”, afirmou Coutinho, que preside a Fundação João Mangabeira.
O processo de renovação, afirmou Coutinho, é fundamental para superar tanto a crise do país como a “antipolítica” do governo Jair Bolsonaro. “O ministro do Meio Ambiente é antiambientalista. O Ministério da Saúde quer destruir o SUS [Sistema Único de Saúde]. E o ministro da Educação combate as universidades públicas”, disse o ex-governador paraibano.
Coutinho avaliou que a população brasileira quer recuperar a esperança perdida por conta do descrédito em relação à política partidária. “O PSB é um partido popular e tem obrigação de produzir algo que faça as pessoas reivindicarem políticas e serviços públicos de qualidade”, afirmou. “O rentismo do mercado financeiro, a exclusão social, não podem ser permanentes. Sabemos que, no ritmo atual, o capitalismo vai quebrar. As forças de oposição devem criar algo viável para apresentar à população.”
Nessa estratégia, Coutinho considera essenciais as eleições municipais de 2020. “A direita violenta e mentirosa está intacta e suas armas não foram aposentadas”, disse, acrescentando: “Algo que nos distingue, os partidos de esquerda, é a democracia. Do outro lado, o racismo é apoiado nas redes sociais, e isso nós precisamos derrotar”.
Renascimento
“Estamos diante do renascimento do PSB, há um ato de refundação acontecendo, um ato inicial de um longo processo de debate de cada uma das questões que foram apresentadas no documento da Autorreforma”, afirmou Domingos Leonelli , integrante da Executiva Nacional do PSB e um dos autores do documento “Subsídios para elaboração do Programa Partidário”.
Leonelli pontuou que o documento pode ter pontos a serem refeitos mas foi elaborado com muito fervor: “A Comissão de Validação preparou o texto com muito empenho. Inicialmente ele deveria ter cerca de 30 páginas, mas foi finalizado com mais de 120”. O socialista reforçou que o partido tem muitas personalidades importantes e, portanto, a experiência necessária para propor uma reforma radical e profunda de reestruturação do atual modelo de desenvolvimento.
“É muita emoção presenciar um partido que renasce, renasce com sua militância, com o povo e seus filiados.” Assim o ex-senador João Capiberipe (PSB-AP) iniciou sua manifestação na plenária final.
Capiberibe afirmou que o partido tem um manancial de experiências bem-sucedidas e agora só precisa conectar esses momentos com a militância e todos os filiados, em seguida com a sociedade brasileira. “Essa disposição foi manifestada pela decisão do presidente Carlos Siqueira em propor uma autocrítica”.
O vice-presidente nacional de Modernização Partidária expôs a necessidade de todos entenderem a importância da comunicação em rede. Capiberibe reforçou que o PSB está trabalhando para estar a par das novas tecnologias e enfrentar as mudanças que se apresentam. Buscando uma conexão direta da direção nacional do partido com as direções estaduais, a equipe de comunicação do partido criou um aplicativo. “A novidade tecnológica surge com a Autorreforma. Peço que se conectem ao aplicativo do PSB. Vamos conversar com todos os nossos filiados, com todas as nossas direções estaduais e regionais”, afirmou.
Alessandro Molon (PSB-RJ), deputado líder da Oposição agradeceu a presença dos participantes da Conferência no Rio de Janeiro e parabenizou pela iniciativa do partido em questionar o que deve ser feito quando o país vive o momento mais grave desde sua redemocratização. “O PSB tá se perguntando: Será que vamos reforçar uma polarização que presta um desserviço ao Brasil ou vamos colocar o partido a serviço do país? Escolhemos a segunda opção, reformar o partido para reformar o país”.
Molon também citou o trabalho da oposição para resistir aos retrocessos atuais, a redução de danos feitos em propostas do governo federal e também a coragem do PSB em fazer autocrítica. Segundo o deputado “o ato de se analisar é corajoso”, e o que foi feito de errado no passado tem que ser refeito. “Quem não tem coragem de fazer o exercício da autocrítica se condena, nós estamos retomando a bandeira da ética na política. Não temos compromisso com o erro, temos compromisso com o país”, declarou.
Mais justiça e participação
A deputada federal Lídice da Mata (BA) abordou a necessidade de mobilização popular. “Não podemos continuar convivendo com a violência que se abate sobre a mulher no nosso país. Vamos solidificar a ideia de que os que estão abaixo devem caminhar junto com todos, construindo uma sociedade mais justa com a participação de mulheres brancas, mestiças, indígenas e negras, e militando nesse partido cada vez mais receptivo a nossa participação”.
O deputado João Campos (PSB-PE) aproveitou a plenária para convidar os demais socialistas a participarem da CPI que investiga o vazamento de óleo nas praias brasileiras. “Vamos trabalhar para que essa CPI seja um local de atuação do partido. O Brasil é solidário ao nordeste e nós não podemos permitir o preconceito do governo federal conosco. Chegou a hora de vermos o real valor da palavra patriotismo, não adianta falar em patriotismo e não cuidar do meio ambiente”, disse.
A deputada estadual Cida Ramos (PSB-PB) reforçou a importância de continuar lutando para que o país não retroceda ao totalitarismo. “A democracia vai prevalecer no Brasil”, disse. Ao finalizar seu discurso, Cida citou Guimarães Rosa: “A vida esquenta e esfria, aperta e afrouxa. O que ela quer da gente é algo que a Paraíba e o Brasil com certeza têm: coragem. E isso nós temos de sobra”.
Moção contra a MP 905
Durante a plenária, os socialistas aprovaram um moção, a ser encaminhada à bancada do PSB na Câmara dos Deputados, contra a Medida Provisória 905, que precariza as regras trabalhistas para a contratação de jovens, na nova modalidade de contrato ‘Verde Amarelo’.
O texto, proposto pela vereadora de João Pessoa Sandra Marrocos e pela deputada estadual Cida Ramos, ambas da Paraíba, afirma que a medida “trará grande prejuízo à sociedade” e reduzirá “a proteção do Estado aos mais humildes”, na medida em que extingue o serviço social nas agências do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).
Além dos atendimentos previdenciários, os assistentes sociais lotados nas agências preparam laudos sociais para o acesso da população vulnerável ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) para deficientes e idosos em situação de extrema pobreza.
“Solicitamos que toda a Bancada Federal do PSB, após emendas dos colegas deputados federais Capiberibe e Danilo Cabral, que garante a permanência das assistentes sociais do INSS, se coloquem em defesa da permanência desses profissionais nessa instituição”, diz a moção. “Reafirmamos, assim, o compromisso do Partido Socialista Brasileiro em defesa do serviço social na Previdência”.
Confira no vídeo o resumo do dia:
Assessoria de Comunicação/PSB nacional