Alexandre de Freitas Barbosa, economista, no debate da Autorreforma do PSB. (Imagem: Reprodução)
“Defendo a tese de que desenvolvimento não é uma questão apenas de Economia, e está deixando de ser, no sentido geral, da compreensão social. E nesse aspecto, o livro da Autorreforma é bastante fiel”, disse o economista e pesquisador Alexandre de Freitas Barbosa durante a terceira Oficina Temática da Autorreforma do Partido Socialista Brasileiro (PSB), realizado nesta segunda-feira (22), com o tema ‘Socialismo brasileiro, criativo e democrático’.
A abertura da oficina foi realizada pelo presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira. “Nessa nova fase de elaboração da Autorreforma, assumimos que o socialismo precisa estar ligado à criatividade, mas principalmente estar comprometido com a democracia. Nesse movimento, manteremos nossa marca, admitindo a democracia como fator essencial do desenvolvimento”.
No entanto, ainda para abrir os debates, o presidente fez uma provocação. “Quando falamos em desenvolvimento, isso quase sempre remete à economia. No entanto, embora tenhamos conquistado avanços sociais nos últimos anos, as desigualdades continuaram a se aprofundar. O desenvolvimento compõe um conjunto de fatores. Então, por que estamos patinando nos últimos anos e não voltamos a crescer? O desenvolvimento precisa ser sustentável para ocorrer de verdade”.
Domingos Leonelli, presidente do Instituto Pensar e membro da comissão de redação da Autorreforma, destacou que o socialismo criativo, na Autorreforma, tem o objetivo geral de longo prazo e também de método – de prática política.
“Pensamos um socialismo profundamente brasileiro, profundamente democrático e criativo. Já temos exemplos, como em Portugal, com muita participação da criatividade na salvação da economia”.
Com as mudanças na geopolítica, o PSB avançou na discussão da modernização das teses. “Compreendemos que o socialismo brasileiro precisava mudar de caráter. Para alcançarmos um nível mundial de desenvolvimento, uma inserção soberana na economia global. É isso que nós estamos buscando. Queremos ser um partido modernamente democrático, prepararmos nosso partido para atuar dentro dessa premissa. Atuar no socialismo como prática politica. Porém, para chegarmos a uma sociedade socialista, precisamos cumprir uma séria de etapas”, explica Leonelli.
Socialismo, economia e criatividade
Doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mestre em História Econômica pela USP e coordenador do núcleo temático “Repensando o Desenvolvimento” do Laboratório Interdisciplinar do IEB/USP (LabIEB), Alexandre de Freitas Barbosa iniciou o debate ressaltando a elaboração do livro de teses da Autorreforma, reconhecendo que a participação social na construção do novo manifesto do partido é um movimento socialista e democrático inovador.”Lendo esse documento, eu me senti contemplado”.
Barbosa é professor livre-docente de História Econômica e Economia Brasileira do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo (IEB-USP). “Defendo a tese de que desenvolvimento não é uma questão apenas de Economia, e está deixando de ser, no sentido geral, da compreensão social. E nesse aspecto, o livro da Autorreforma é bastante fiel”, disse.
Na sua aula, o pesquisador apresentou as contradições históricas do desenvolvimento, também chamado de “desenvolvimentismo” para explicar decisões governamentais.
“Nós precisamos sair o alçapão para poder enfrentar as contradições, porque vivemos um cenário de terra arrasada que nos impede de debater o desenvolvimento, inclusive”
Alexandre Barbosa
Barbosa lembrou que o período pós-Constituição gerou condições para a emergência das novas pautas nacionais e o crescimento dos novos partidos, mas não modificou a posição do Brasil na divisão internacional do trabalho, culminando no acúmulo de problemas nos cenário político nacional. “As contradições de um período se refletem na outra. O governo Lula, por exemplo, sofreu efeitos da era FHC [Fernando Henrique Cardoso]. Mas foram dois governos que tentaram criar novas políticas”, explicou.
Com isso, o país “quebrou” com sucessivas crises econômicas globais e na precarização dos serviços nacionais, como a crise energética. “No ano 2000, tivemos o avanço das desigualdades. Deixamos de falar de dependência – econômica – e passamos a reproduzir a ideia de que um país desenvolvido é um país sem pobres”, explica. Durante o debate, o pesquisador também criticou a ideia de renda básica universal. “Uma ideia puramente liberal”, disse.
No contexto das novas lideranças globais, Barbosa destacou que a China oferece, nesse contexto, um processo de inovações. “Mudanças estruturais de impacto da economia que o Ocidente é incapaz de compreender e que bate no capitalismo, mas não somos capazes de rebater de volta”, diz. Para ele, mais recentemente, o capitalismo apresentou o recrudescimento da sua face, com o aumento da pobreza. “Criamos o capitalismo mais desigual do mundo”.
No contexto do atual governo, Barbosa defende combater a ideia impulsionada pelo atual presidente de que sem reformas – administrativa, tributária – não há crescimento. “Não dá pra dizer que Bolsonaro não implementou políticas, porque houve apoio da bancada governista no Congresso a ações nesse sentido, sim. Mas temos de avançar, de inovar na nossa crítica. Aliás, quem tem de fazer a autocrítica é quem pretende transformar”, ressalta.
Durante o debate, o pesquisador criticou a forma “de pensar o desenvolvimento” na história da economia. “Como Darcy Ribeiro vai dizer, Brasil é uma sociedade enferma de desigualdades. Achar que transferência de renda vai mudar a natureza do capitalismo quer dizer que pensamos de maneira pouco ousada. Aqui a questão é interdisciplinar”, explica.
Para ele, as novas formas de ação do estado, bem como no contexto da organização social, acontecem em momentos de crise internacional com oportunidades. “E o pensamento é moldado nas contradições. Eu só posso atuar na conjuntura a partir de uma interpretação de longo prazo”, avalia. E que a desmobilização também atinge a classe acadêmica. “Utilizamos o termo desenvolvimentismo, mas empobrecemos o conteúdo. De certa maneira, faço a autocrítica porque sempre estive no campo democrático popular”, ressaltou.
Alexandre Barbosa citou como referência fundamental para o debate o sociólogo norte-americano, Erick Ollin Wright, que apresenta a transição do atual sistema econômico global para o socialismo na opção pela ruptura, pois “não dá mais pra ficar refém dos juros altos”; a intersticial, pela qual a interseção entre os dois sistemas é possível em setores específicos; e a simbiótica, de atuar dentro das instituições capitalistas para transformar o próprio capitalismo.
De acordo com o pesquisador, o documento da Autorreforma é robusto e coerente, a ser lido pelos demais partidos de esquerda. “Redução de desigualdade, economia verde, são temas muito bem tratados no documento”, diz. Sobre a questão do agronegócio e a agricultura familiar, só é possível utilizando a questão ambiental para transformar o agronegócio e com um estado participando fortemente dessa relação”.
“Estado forte, democrático e eficiente com planejamento enraizado na sociedade com reformas de alta intensidade”
Alexandre Barbosa
No contexto da política externa, cabe ao processo da Autorreforma analisar o lugar do Brasil no mundo. “A China serve de modelo? Talvez possamos nos inspirar na China para desenvolver o nosso modelo de desenvolvimento econômico baseado no socialismo. China é parte do sistema que devemos compreender. Enquanto os Estados Unidos não querem mais nada com a periferia, a China propõe um modelo de cooperação de modelo de desenvolvimento de acordo com os interesses deles. Porém, se nós formos capazes de negociar, é capaz de eles virem conosco.”
Leia também: O Brasil precisa entrar na revolução 4.0 e a educação é a chave, defendem Coutinho e Luchessi
O pesquisador Sinoel Batista, membro da comissão de sistematização das teses da Autorreforma, trouxe o debate sobre estratégias para alcançar o socialismo no Brasil, a partir da ideia defendida pela tese 389 do documento, de que a revolução crítica não envolve ruptura com o atual contexto político, mas a promoção de políticas que promovam transformações.
“Se a solução está na política, alcançar o socialismo passa por fortalecer fundos públicos e políticas públicas com processo de inclusão permanente. enfim, seriam rotas para o caminho do socialismo”, destacou. Sinoel Batista
Barbosa analisa que os investimentos nacionais são fundamentais nesse processo. “A partir do momento que o fundo publico é que permite saltos tecnológicos e aumentando a taxa de lucro dos vários capitais, o capital para desenvolver nao depende mais da super exploração da força de trabalho. “O que fazer com a Caixa, o Banco do Brasil e do BNDES? Como formar campeões nacionais?”, questionou.
Nesse contexto, os investimentos já realizados pelo governo brasileiros em países aliados e voltados ao desenvolvimento estratégico latino americano contribuíram para a construção de uma política internacionalista que potencializou o desenvolvimento nacional. “A política idealizada estava correta”, defende.
Raissa Rossiter, também representante da comissão de sistematização, questionou sobre como atuar por um projeto de desenvolvimento que assegurem a sustentabilidade, inclusive, compreendendo a necessidade da força de trabalho do desenvolvimento solidário para a economia criativa. “No alçapão que estamos, como resgatar esse movimento e fortalecer”.
“As pessoas acham que emprego é no setor assalariado no campo capitalista. Mas é um campo de oportunidades. é um setor subordinado intersticial porque depende das oportunidades do capitalismo. Sem altos salários não temos consumidores para trabalhadores autônomos da alimentação, como vendedores de cachorro-quente”. Alexandre Barbosa
Barbosa também apontou o problema da precarização do trabalho no Brasil, com o aumento de novos casos de trabalho escravo. “Precisamos combater os assalariados que tem não direitos. Vemos o desmantelamento de instituições importantes de fiscalização e controle do trabalho, como o Ministério Público do Trabalho. Precisamos fazer com que as instituições voltem a funcionar no Brasil”, diz.
O pesquisador encerrou falando sobre as novas formas de apropriação das inovações capitalistas. “Precisamos discutir como vamos nos apropriar a qual será essa apropriação. Por exemplo, sobre as tecnologias verdes. Temos de dar um salto nesse setor, gerar economia nesse contexto”, finaliza.
Barbosa lembrou os Pontos de Cultura. “Foram um avanço, mas podemos avançar”. E citou Emicida. “é um grande intelectual. Vende cultura e inclui a periferia, além de ser o autor da sua produção”, diz.
Teses da Autorreforma
Durante as oficinas, são analisadas as teses do Livro 5 com liberdade total dos palestrantes, não havendo, no entanto, compromisso da Comissão de Sistematização com as ideias defendidas por eles.
As oficinas serão são mais um importante momento para aprimorar as propostas que o PSB levará para o Congresso Constituinte da Autorreforma que será realizado em abril de 2022.
Os inscritos recebem certificados de participação e uma publicação impressa do Livro 5 de teses da Autorreforma.
O post Socialismo e economia no Brasil foram debatidos em oficina da Autorreforma do PSB apareceu primeiro em Socialismo Criativo.