As experiências internacionais para enfrentar crises políticas, econômicas e sociais foram abordadas no terceiro e último dia da Conferência Nacional da Autorreforma do Partido Socialista Brasileiro (PSB). Diante dos inúmeros obstáculos enfrentados pelos socialistas ao redor do mundo, o PSB avalia que é fundamental conhecer o que os partidos de esquerda estão realizando em seus países e trocar experiências que fortaleçam a democracia e qualifiquem os sistemas políticos.
Para este debate, foram convidados os deputados portugueses Hugo Alexandre Pires e João Paulo Moreira Correia, do Partido Socialista, e a deputada espanhola Olga Alonso Suárez, do Partido Socialista Obreiro Espanhol (PSOE). Antes que os convidados estrangeiros pudessem iniciar suas falas, o deputado federal Alessandro Molon, do PSB, leu uma nota de repúdio sobre o cancelamento da assinatura da Folha de S. Paulo pelo governo de Jair Bolsonaro, em mais uma medida descabida em tempos de democracia.
Esta nota, inclusive, encontrou respaldo na fala de Hugo Pires, que afirmou: “Precisamos tomar cuidado com a democracia. Quem derruba democracias hoje são os eleitos por ela”. A deputada Olga Alonso, que abriu a mesa de debate com seu depoimento, também apresentou preocupação com o regime democrático espanhol.
De acordo com ela, “aqui, temos todos as mesmas inquietações e vontades, sobretudo em melhorar a vida dos cidadãos de nossos países”. “A Espanha precisa mudar suas leis de regime geral de eleições. O bipartidarismo acabou. O diálogo não pode ser uma questão mercadológica de cargos no governo”, afirmou a deputada.
Olga falou também sobre a difícil situação política espanhola, que enfrentou diversas eleições nos últimos sete anos. Ela também apresentou sua preocupação com o crescimento da extrema-direita e do fascismo nas camadas mais populares da Espanha, insatisfeitas com a ascensão da esquerda ao poder.
A deputada alertou para o crescimento de um discurso xenófobo e de ataque às mulheres e minorias históricas no país. Ela citou o exemplo da situação em Madrid, cujo governador é apoiado pelo Vox, um partido com um duro discurso contra a imigração, os movimentos LGBT e o feminismo. Olga lembrou que há poucos dias, em 25 de novembro, Dia Internacional contra Violência de Gênero, muitos deputados da extrema-direita fizeram declarações que minimizam esse movimento. Em alguns congressos, alguns deputados não puderam ler suas notas de repúdio.
A deputada Olga terminou sua fala com um apelo. “A situação na Catalunha é complicada. Precisamos governar para o povo. Porque neste momento a Espanha não pode permitir outra coisa. Eu agradeço pelo convite. E digo: pela Espanha, lutaremos. Nós vamos continuar lutando. Por que eu entrei no congresso? Se eu perdi a ilusão? É muito difícil, mas eu sou política, uma mulher política, professora e sindicalisma, e quero lutar pelas melhoras do PSOE. É por isso que estou aqui: precisamos aprender uns com os outros”.
Ao fim da fala da parlamentar espanhola, Molon agradeceu a presença de Olga, e reforçou o momento político internacional, de “dificuldades, resistência e, enfim, vitórias. Em seguida, ele conduziu o deputado João Paulo Moreira Correia, de Portugal, ao seu lugar de fala. Antes, teceu elogios ao governo português, vitorioso nas últimas eleições.
Ao começar sua palestra, o deputado português fez duas importantes considerações: “nosso governo não é presidencialista. Ele é semi-presidencialista, então temos um primeiro ministro, que rege o nosso parlamento. Ademais, Portugal integra com a Espanha um espaço chamado união européia. Por isso, integramos um espaço econômico distinto ao encontrado no Brasil.”
O parlamentar, em sua fala, fez uma breve retrospectiva histórica dos últimos anos em Portugal, principalmente a respeito da crise econômica que abateu o país no início do século. Ele lembrou que até 2015 “a situação estava muito difícil para o povo português. Portugal tinha desemprego de 14%. Os bancos estavam para falir”.
Neste sentido, ele até fez uma brincadeira, e disse: “Precisávamos da ajuda do Estado para evitar o colapso. E a direita gosta de demonizar o Estado, mas, quando precisa, eles recorrem ao Estado, principalmente os bancos privados. Aqueles que faliram, que deixaram o povo em maus lençóis, também dependeram do Estado português para se reerguer”.
Voltando à retrospectiva, João Paulo Moreira Correia comentou que a direita impôs uma dura austeridade até 2015, “quando então foram rejeitados nas eleições”. Quando a esquerda assumiu o país, “havia muitas diferenças entre os partidos progressistas”. “Sempre que existe um PL que reforça a influência da UE em Portugal, há muita discussão na esquerda portuguesa”, afirmou.
Contudo, o deputado disse que “aquilo que tínhamos em comum era mais forte. Precisávamos tirar o país da pobreza, e resgatar aqueles direitos perdidos com os cortes dos governos de direita. Foi isso que nos ajudou a governar”.
Entre as medidas (de direita) que precisaram ser revistas pelo Partido Socialista Português quando assumiu o país, o deputado destacou que o “governo de direita achava que quanto mais baixos os salários, mais competitiva seria nossa economia. Eles queriam a redução do déficit, e então aumentaram os impostos. Aumentaram para os mais pobres e a classe media, os trabalhadores. O que aconteceu foi que o desemprego aumentou, e aqueles que tinham emprego, perderam poder de compra. Os cortes nas pensões também ajudou a quebrar o país. Isso era um direito construído ao longo de décadas. Um direito do trabalhador português”.
“Cortaram também gastos na saúde, nos serviços públicos, como estradas e linhas ferroviárias. Mas o pior deste movimento foram as privatizações. Há áreas em que o Estado assume e não precisam ser lucrativas”, disse João Paulo Moreira Correia. “Nós, congressistas, salvamos o transporte público em Portugal. Isso foi fundamental para provar que o Estado pode gerir serviços melhor do que a iniciativa privada.
Entre medidas que serviram para recuperar o país, o socialista destacou o aumento do salário mínimo, que até fim do mandato do partido crescerá em 58%, e a geração de emprego públicos. Com a chegada de mais postos de trabalho, a economia voltar a ficar aquecida. Ele também rejeitou a idéia de que um governo socialista desestimula investimentos estrangeiros. De acordo com João Paulo Moreira Correia, “os investimentos nunca estiveram tão altos”.
Com efeito, ele destacou que “nos em quatro anos, 200 mil pessoas foram retiradas da pobreza. Criamos políticas para deficientes, aumentamos os planos odontológicos para as famílias e aumentamos as aposentadorias”.
Ao fim, ele concluiu, “Eu quero dizer o seguinte: o crescimento econômico só vale a pena se for canalizado para combater as desigualdades sociais. É preferível ver um pais crescer menos combatendo a pobreza do que crescer muito em um pais de miseráveis. Esse é o compromisso e o desafio do Partido Socialista Português.
Último convidado a palestrar, Hugo Pires começou sua fala demonstrando preocupação com a democracia. Para ele, nenhum país no mundo está isento das crises da democracia. Neste sentido, ele afirmou que deposita “uma grande esperança no PSB. Isso, porque não há democracia sem partidos fortes. Se nos olharmos para esquerda brasileira, eles não estão tão fortes. E, sim, estou falando do PT. O PSB tem uma grande oportunidade, que é dar esperança ao povo brasileiro e a esquerda democrática do Brasil”.
Hugo foi capaz de fazer uma autocrítica à esquerda no mundo. Segundo ele, “existe esse declínio dos partidos tradicionais no mundo, pois eles foram incapazes de resolver os problemas das pessoas. Durante muitos anos, poucos conseguiram dar respostas aos anseios e às necessidades da população.
Para ele, “esse é o nosso grande desafio! Defender o estado de bem estar social para todos. Educação, Saúde e Seguridade social para todos”. Antes que terminasse a sua fala, o deputado fez mais um apelo aos brasileiros: “não podemos tratar os adversários como inimigos. Que nós socialistas tenhamos a capacidade para fazer essa política social que tanto falamos com as contas equilibradas”.
Antes que a mesa encerrasse seus trabalhos, o deputado Federal Alessandro Molon leu uma moção levada até à mesa sobre o crime ambiental no nordeste e a ausência de esforços por parte do governo federal. Ele enalteceu a CPI do óleo e o trabalho de Joao Campos, do PSB de Pernambuco. A CPI tem por objetivo encontrar a origem do óleo, assim como avaliar o trabalho dos órgãos responsáveis pela limpeza nas praias nordestinas.